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Cantor, compositor, violonista, poeta e professor, Beto Gaspari possui uma trajetória artística que se estende desde 1987. Formado como técnico de violão pela Escola de Música Villa-Lobos e licenciado em Música pela UFRJ, ele possui uma carreira multifacetada que abrange a música e o teatro.

Desde 1999, participa de festivais em diversos estados, incluindo Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Paraná. No teatro, ele se destaca compondo trilhas originais, cantando, tocando, dirigindo musicalmente e escrevendo desde 1987. Desde 1999, faz parte da Cia de Arte Popular de Duque de Caxias e integra a equipe do premiado espetáculo infantojuvenil “O Brincado Romance de Flora e Valentin“, que estreia no próximo dia 04 de agosto, às 16h, no Sesc São João de Meriti. 

Com trilha sonora original de Beto Gaspari, o espetáculo é uma aventura infanto-juvenil  lúdica musical, que emerge em histórias e lendas em torno do Rio São Francisco, através das andanças aventureiras de dois jovens. Preservando a forte influência da oralidade presente nas culturas africanas, cujas histórias e tradições são perpetuadas pelos GRIOTS, os sábios e respeitados contadores de história,  uma Griot, conta o brincado romance de Flora e Valentin. Uma brincadeira. Um mal súbito. E o coração da menina Flora é levado feito folha rio abaixo. O menino Valentin parte em missão beirando as águas do  Rio São Francisco, o Velho Chico, para resgatar o coração de sua amada. O heroi cavaleiro errante enfrentará desafios, decifrará enigmas e descobrirá que o amor tudo faz florescer. 

Para entender detalhes da trilha sonora e descobrir um pouco mais sobre este trabalho, confira uma entrevista exclusiva com o artista.

Você assina a trilha sonora e a direção musical deste espetáculo. Conta um pouco sobre como foi fazer este trabalho?

Trabalho com a Companhia de Arte Popular de Duque de Caxias desde 1999. A cada novo trabalho pensamos coletivamente em quem convidar para ser o Diretor Geral, e a partir da proposta de encenação, vamos acrescentando camadas ao processo, e a trilha sonora é uma dessas camadas.

O encenador e o coletivo definem como será esta trilha. Temos optado, na maioria das vezes, por trilhas originais ou mescladas com cantigas de domínio público. Neste espetáculo optamos por mesclar canções autorais com cantigas de domínio público. Foi novamente gratificante participar da pesquisa de como apresentar as cantigas já existentes, com as autorais e as muitas possibilidades de trazer isso à cena.

Conseguimos, mais uma vez, colocar todos os atores cantando e tocando algum instrumento, e como também já nos propomos há tempos, trazer novas sonoridades, seja no canto, seja na instrumentação.

Quais elementos culturais e musicais você incorporou para enriquecer a narrativa da peça? Pode nos detalhar um pouco mais sobre esse processo?

Como o espetáculo é imerso e inundado pelas águas do Rio São Francisco, fui beber nesta fonte, nas canções populares do entorno do Rio e nas cantigas de nossos ancestrais.

Acrescentamos a sanfona para destacar o traço regional na sonoridade; uma parte da instrumentação está no violão imitando as tríades feitas nas violas caipiras; trouxemos o som da kalimba e seu som ao mesmo tempo suave, fluido e mágico para convidar o espectador a mergulhar em nossa história. A cantiga inicial lembra o cântico dos griots na contação das histórias. A cantiga na qual Flora e Valentin se identificam nos seus afetos é o desprendimento de que ao mesmo tempo flutua e é arrebatado pelo amor.

 Como você avalia o papel da música na criação de um ambiente lúdico e envolvente para o público infantojuvenil?

Acredito que se deva buscar surpresas sonoras que façam com que este público se pergunte: de onde vem este som? Ou: quem cantou agora? Entendo que isso se dá muito também pelo espectador poder ver o que, quem e como fez para aquele som surgir.

Quais foram os principais desafios musicais encontrados durante o desenvolvimento da peça?

Primeiro desafio foi o de sempre: será que vou dar conta de criar e, junto com a Cia, fazer acontecer com a beleza, a magia e a tranquilidade que o texto, o coletivo e a encenação merecem?

Tive que fazer e refazer algumas canções por não ter entendido o viés de uma personagem, ou não ter entendido o contexto da encenação em algum momento, mas ao final tudo se harmonizou muito bem.

Contribuir da melhor forma possível para que a história seja contada de forma bela, e que ela, a história, seja a principal coisa que nosso público leve na memória.

Fazer com que atores, que não estudaram música se entreguem e acreditem que são mais que capazes de tocar e cantar com a mesma desenvoltura com a qual interpretam. 

Outra coisa que também é o de sempre: não exagerar; fazer o que a encenação necessita, sem tirar, nem pôr. 

Teria alguma curiosidade da parte musical que você acha interessante contar? 

Quando lemos o texto pela primeira vez, ficou na minha cabeça a proposta de um maracatu cearense épico para a personagem Valentin e uma cantiga ternária sutil e suave para introduzir a história. Essas melodias ficaram na minha cabeça por anos até desaguarem nesta montagem.

Numa das canções, pensei numa melodia e numa letra mais densa, cheias de dor e reflexão, mas a partir de uma conversa como Diretor, chegamos à conclusão que a personagem era carregada de dores, porém era sarcástica, espirituosa. Daí lembrei de uma cantiga que a atriz que interpreta esta personagem cantava em alguns ensaios, em tom de brincadeira. Viajei naquela onda e compus a melodia e a letra como primas daquela cantiga que ela brincava com a gente.

Além disso, também integra o elenco de “O Brincado Romance de Flora e Valentin”. Conta um pouco sobre seu (s) personagem (s)?

Na verdade, não tenho uma personagem com texto, nome, marcações ou interferência direta no contexto da história. Me insiro como mais um dos elementos místicos que contribuem para que a história flua como um rio, ora cantando, ora contando, ora sonorizando as cenas.

Para ti, o quão especial é poder também integrar este elenco e projeto?

A arte é minha forma de inserção no mundo. A Cia é o quintal onde meu sonho montou minha rede, onde estou e me sinto em paz. Em particular, este espetáculo me conduz a muitos lugares, como o Valentin, seguindo o rio da vida para chegar até o mar, encontrar ou reencontrar meus afetos. A personagem principal tem o nome de minha filha mais nova, que infelizmente, já não está mais conosco… Cantar pra ela no espetáculo, como sempre cantei, é mais uma motivação divina e humana ao mesmo tempo.

 O que o público pode esperar desta peça?

Muito amor, carinho, dedicação, surpresas, conhecimento, histórias, cultura popular, viagens pra dentro, imagens de fora, sonhos, rios , mares, estradas, a aldeia de cada um e o mundo de todos nós.

 Como você se sente ao participar de um espetáculo que celebra os 27 anos da Cia de Arte Popular não só como ator, mas também atuando na trilha sonora e direção musical do projeto? O quanto isso é significativo para a sua trajetória?

Percebo o quanto tem valido a pena viver, aprender, compreender, reascender e reacender o brilho nos olhos de quem vem participando e nos assistindo ao longo do tempo. É bom demais estar num projeto que fala de amor, cultura popular, infância, brincadeira e da natureza.

Para minha trajetória é muito significativo olhar para trás com prazer e olhar para frente com amor, esperança e coragem como Flora e Valentin.  

E como estão as expectativas para a apresentação de estreia?

Eita! Muita vontade de ver os olhos e ouvir vozes e sorrisos da gente dos lugares por onde passarmos. Como diz uma das canções do espetáculo:

“Cada encontro e caminho
Com choro ou com sorrir
Faz a gente entender
Que é preciso prosseguir” 

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